Maria Izabel Arndt
- Quem fez o mundo?
- Deus fez o mundo.
- Deus é justo e bom?
- Sim, justo e bom.
Este diálogo, repetido quase como um mantra ressoa ainda como o badalar dos sinos de bronze daquela velha e pequena igreja. Sentia o coração bater na garganta, tal era o desejo sincero de saber: e quem fez Deus? Mas esta , eu sabia, era uma pergunta proibida. E eu não me atrevi...
Por isso o silêncio... Por isso eu , a repetir: Deus fez o mundo... Deus é justo e bom.
Tinha oito anos, mais ou menos, e me preparava para a primeira comunhão. O Padre Libório, também respeitável comerciante da cidade, prestes a desaparecer, viria no final do ano para o Sacramento. E veio! Vestia sapato branco, véu e uma pequena tiara (eu, não o padre).
- Eu , pecadora, me confesso... porque pequei muitas vezes... respondi para minha mãe; briguei com minha amiga... (Só? E se eu esqueci de algum? Será que menti?)
Não. Mentir era absolutamente impossível com o pai que eu tinha... Ele havia inscrito em mim uma lista de pecados da infância (e de toda a vida) e colocado no seu topo a mentira. O jeito era falar sempre a verdade!
Bem, se Deus existe e ele é justo e bom, sabe do meu esforço para lembrar de todos os meus pecados. Tanto que, na dúvida, inventei um, não lembro exatamente o que foi. Quando se trata de confessar, é melhor sobrar do que faltar...
Mas e a mentira? O que mereceria maior castigo? Esquecer algum? Ou inventar outro?
Enfim...confessados os pecados, vividos e inventados, o Padre deu a penitência:
- Reza um pai-nosso, dez ave-marias , um creio em deus padre e não voltes a pecar!
Pecado é fazer isto com as crianças!
Um pecado aceito e perpassado como dogma. Aliás, há pecado maior que coibir a criança a pensar? Se há uma determinada crença no pecar, por que fazer que suas capacidades de pensar se resumam em pecados, em perdões, em criadores; e não em razão, em vida como oportunidade (e não pagamento de uma dívida), em ser capaz de criar (como a criança o deve ser). Há uma certa falta de respeito nisso: pega-se a capacidade das crianças e a transforma literalmente em ser moderado, sobre os moldes dos conformistas-pregadores-dum-mundo-melhor.
ResponderExcluirAcreditar é uma coisa; impor é outra.
Que nossas crianças tenham a chance de ter familiares que pensam por elas, não em si mesmos. Pois, pai e mãe que obrigam a crer não estão estão pensando nas crias, apenas em salvar-se daquilo que nunca teve certeza de existir; que nunca encarou como uma criação religioso-social para governar nações e usufruir de seus dinheiros.